O impacto da Inteligência Artificial (IA) no setor de conteúdo sonoro foi o tema central do painel “Avanços da IA no Rádio Brasileiro”, realizado durante o SET Expo. Com moderação de Eduardo Cappia, conselheiro da SET e diretor da EMC, o painel reuniu especialistas para discutir os desafios, oportunidades e implicações éticas da adoção de IA no rádio, nos podcasts e nas mídias sonoras digitais.
Participaram como palestrantes Álvaro Bufarah Junior, coordenador do Grupo de Pesquisa em Rádio e Mídia Sonoras da Intercom; Tuta Neto, CEO da Sampi e diretor de novos negócios da Jovem Pan; e Carlos Aros, diretor de conteúdo da Rede Jovem Pan News.
Abrindo a discussão, Bufarah Junior apresentou um panorama sobre o uso crescente da IA nas emissoras de rádio. Ele destacou que ferramentas como o ChatGPT ampliaram significativamente o acesso e a adoção de IA, e que o número de soluções disponíveis vem crescendo de forma acelerada.
Entre as aplicações em uso no setor, o especialista citou a clonagem de voz, conversão de texto em fala, geradores de música e ferramentas de análise de sentimentos. Um dos pontos de atenção, segundo ele, é o uso de vozes sintéticas geradas por IA, inclusive de personalidades já falecidas, o que levanta debates importantes sobre ética e direitos autorais.
“Um exemplo é o caso da radialista brasileira Gisele Souza, cuja voz foi comercializada como se fosse de uma IA”, alertou. Bufarah Junior também lembrou que, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), cerca de 8,6% das empresas em países de alta renda estão potencialmente expostas à automação por IA.
Ele ressaltou que, antes mesmo de discutir Inteligência Artificial, muitas emissoras ainda podem se beneficiar de tecnologias já disponíveis, como os sistemas de CRM, para manter a competitividade.
Conteúdo como valor central
Tuta Neto abordou as transformações no consumo de conteúdo e afirmou que o meio está se tornando cada vez mais irrelevante frente à força do conteúdo. “É o conteúdo que conecta as pessoas. O que importa é a credibilidade da marca e do canal”, destacou.
Segundo ele, o rádio enfrenta o desafio de se adaptar a novos formatos, como a transmissão em vídeo, e de competir com influenciadores digitais que hoje ocupam espaço significativo na cobertura de grandes eventos, como a Copa do Mundo. Nesse contexto, a IA surge como aliada poderosa.
“A IA já está pronta, acessível a milhares de pessoas e com custo reduzido. Quem não adota perde competitividade, atrasa a inovação e compromete o crescimento”, afirmou. Tuta Neto também apontou que o novo papel do jornalista envolve investigar, criar narrativas e desenvolver opiniões para múltiplos canais e formatos.
Carlos Aros compartilhou a experiência da Jovem Pan com a integração da IA às rotinas de produção de conteúdo. Segundo ele, há mais de dez anos a emissora iniciou um processo de transformação para adaptar seus formatos às exigências das plataformas digitais. “Hoje, estamos presentes em todas as plataformas, e isso exige acompanhar as novas tecnologias”, declarou.
Aros ressaltou que o maior desafio é reforçar o papel do jornalista num cenário em que a IA ocupa cada vez mais espaço. “O jornalista precisa ampliar sua capacidade de entrega e manter a qualidade. As pessoas precisam perceber valor no conteúdo feito por humanos, mesmo quando gerado com o apoio da IA”, disse.
Ele explicou que algumas emissoras da Jovem Pan já utilizam conteúdo automatizado mesclado com produções locais, potencializando a entrega ao público. O diretor também citou os exemplos da BBC e da NPR, que adotaram soluções de IA para otimizar suas produções em múltiplos formatos.
A Jovem Pan, segundo Aros, utiliza IA também nas redes sociais, com ferramentas que seguem um padrão editorial. “Hoje temos mais de 4,2 bilhões de visualizações nos nossos conteúdos. Esse ganho de escala só é possível quando a equipe compreende que a IA está a serviço do jornalista”, afirmou.
Apesar das vantagens, ele reforçou a importância da curadoria humana. “O risco está em aceitar tudo o que a IA diz, sem checagem das fontes. É preciso senso crítico. O jornalista deve estar no comando”, concluiu.